terça-feira, 25 de setembro de 2007

Monólogo com o espelho

É bom ficar diante do espelho, não é? O interlocutor sou eu mesmo, e este monólogo mais parece um dueto... às vezes tedioso, mas serve para limpar os pensamentos. Polir a prataria, melhor dizendo. E não é isso que se faz quando se buscam memórias de coisas perdidas no passado? Outra que é realmente interessante olhar para um cara que repete precisa e mecanicamente tudo o que eu falo... se eu não conhecesse o espelho, não soubesse de suas propriedades, não saberia o que pensar dessa situação inusitada.
Deixa eu ficar quieto. Olha só as minhas rugas, minha cara vincada, meus pés-de-galinha - como dizia minha mãe... marcas antigas de uma espinha mal-espremida na puberdade... Ah, ah, ah... velhos tempos...
Só que há um problema com meu olhar. Está muito profundo... muito fundo, sei lá. Deixa eu fazer uma careta...
- Blaaaaaahhhh!!!!
Hmmm... coisa de gente maluca. E sem ter o que fazer, saliente-se! Ah, ah, ah... impagável!
Ora, quem já não fez palhaçadas na frente do espelho? Bom, quem não fez não sabe o que está perdendo! Um espasmo de felicidade simples e barato...
E eu tenho uma vontade de abraçar esse cara que vejo no espelho!
Sete horas, seu moço. Vamos nessa...

terça-feira, 18 de setembro de 2007

E era você?...

Ainda não creio que era você. Olha, devo confessar que aquele momento foi cruel... parecia que um raio caiu na minha cabeça. Por um acaso você sabe como é a sensação de não estar conseguindo crer em seus próprios olhos, de forma a não distinguir o que é sonho, pesadelo ou realidade? Por quê?
O pior de tudo é ficar sem entender porque isso aconteceu. Será a distância entre nós dois? Não, pois afinal moramos na mesma rua. Então só pode ser a proximidade... isso mesmo, a proximidade de outro alguém. Mas o que buscavas, ingrata? O que querias enfim?
Uma fotografia... de data recente, onde dois velhos amores se encontram, não é mesmo? Eu sempre fui o segundo em tudo... segundo namorado, segunda pessoa a ser apresentada a seus pais, segundo a lhe dar presente de dia dos namorados... segunda vez... talvez seja uma questão de lógica eu ser o segundo em seu coração.
Ingrato eu também sou, pois talvez tenha permitido que isso acontecesse. Afinal, quanto ouvir-dizer nesta cidade... quantas almas zelosas pelas vidas alheias. Sim, saí, muito até, às vezes após te deixar em casa, alegando enxaqueca... reflexos da minha própria natureza, sei lá, de caçador. Se eu sou caçador, você foi uma parasita... que enquanto abraçava, provocava a morte da presa sem que esta soubesse. E assim foi.
Talvez seja o mais justo, não? Voltar para o começo...
Não estou mesmo maduro o suficiente...
Ainda não...
Ainda é cedo pra mim.
E pra nós.

terça-feira, 11 de setembro de 2007

Algumas palavras sobre um sorriso...

Algo como a simplicidade...
É ótimo ver-se feliz desfrutando somente de coisas simples, saber enxergar as boas coisas de uma tarde de brisa suave, de alguns momentos de silêncio, de um começo de noite no portão de casa... sentir todo o sabor de um bom sorvete de massa, de um copo de leite quente pela manhã, de um refrescante gole d' água direto da bica numa caminhada pelo campo. Observar o verde das nobres matas das cidades interioranas, majestosas e imponentes, como que cientes da importância que possuem. E como todas estas coisas são essenciais para uma pessoa. Claro, para uma pessoa que saiba, ou melhor, que queira dar-se conta de tudo isso.
A vida é uma verdadeira montanha-russa... é uma gangorra de emoções, alegrias, tristezas, sucesso, tragédias... e como as tragédias ficam marcadas de maneira muito mais intensa do que os sucessos! Claro, pois, que não é fácil parar para enxergar as coisas simples da vida... mas, para o homem contemporâneo da sociedade de mercado, é uma verdadeira necessidade.
Pessoas como eu precisam destas coisas simples tanto quanto precisam de oxigênio para a atividade resporatória. Não por acaso pessoas como eu sentem-se sem ar quando não estão vivenciando tais momentos... sendo obrigadas a relegar a segundo plano, em nome de necessidade, aquilo que realmente gostariam de estar fazendo em determinado momento...
Pois pessoas como eu acabam percebendo que certas coisas, certos fatos, certos momentos devem ser apreciados plenamente, porque tudo é efêmero, tudo é passageiro, ainda mais quando se trata de grãos de areia como nós, humanos... deve-se, pois, desfrutar de determinados momentos como se fossem os últimos, ainda que não os sejam.
Deve-se desfrutar da alegria de conviver com os irmãos, quando pequenos, na adolescência, na vida adulta e na velhice... não perder a oportunidade de abraçar mamãe e papai e dizer "amo vocês", fitando-lhes os olhos, por não saber se subsistirá a visão... ou se subsistirão as pessoas que queremos ver... Não deixar de ouvir alguns passarinhos, de aproveitar a vida bucólica sempre que possível, rir sempre que possível, na companhia de pessoas de quem se gosta.
Infelizmente, tudo é efêmero... tudo passa...
A natureza incide inevitavelmente sobre todas as pessoas e aos poucos vamos perdendo aquilo que nos dá conforto... que nos segura e nos faz ter vontade de prosseguir... até o dia em que somos apanhados por esta tormenta, e, cansados, nos deixamos levar. Vamos embora do mundo, para sermos esquecidos... Então, tanto melhor buscar este agasalho na simplicidade das coisas, dentro daquilo que realmente conforte, conforme.
Por isso, olhei insaciavelmente para aquele sorriso maroto, meigo... como se nunca mais pudesse fazê-lo, ainda que rogue a Deus para que o possa por muitas vezes mais... olhei naqueles olhos que diziam da felicidade do coração de sua dona, que pulsava junto com o meu... dentro daqueles olhos, vi a chave de toda a simplicidade que busco, e vi todo o brilho desta imensa paz naquele doce sorriso... e agradeci a Deus por estar vivo... ainda que eu me vá em breve, ninguém poderá retirar de minha alma a ternura da simplicidade deste momento...
"Se amar é viver, digo que vivo além da vida, pois vos amo além do amor"!

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Destinos iguais

Hoje parei para ouvir pássaros cantando. Andei pelo jardinzinho de minha pequena chácara e parei para meditar um pouco, ouvindo apenas o som do vento, tão comum nas pequenas cidades, tão constante nas pequenas propriedades... junto com o vento, a brisa fresca de final de tarde, o gorjeio dos passarinhos, voando despreocupados, sem destino certo, pousando nos galhos das pequenas árvores de meu quintal. Vi-me em face de um quintal de sonhos, um lugar gostoso, onde posso despir-me da dura realidade de uma vida adulta cheia de responsabilidades e repleta de duras marcas e tragédias...
Eis que olhei para cima, num pequeno galhinho vi um canarinho e uma canarinha... trocavam leves bicadinhas repletas de ternura, e comecei a pensar... aquele amor natural, sem os vícios da humanidade moderna, repleto de pureza, ternura e tranquilidade... um mistério tão grande, como se aqueles dois pequenos seres, que passam despercebidos pelos olhos da humanidade, estivessem - como julguei que de fato estavam - estivessem trocando confidências, trocando juras de amor eterno, desfrutando do amor no maior grau de pureza possível... longe da maldade que só os seres humanos têm e carregam.
Aquela cena, unida à beleza do fim de tarde no campo, me trouxe grande paz e tranquilidade...
Via, ali, no meio de tanta ternura, minhas prórpias recordações de infância, meu primeiro amor, o grande toque de pureza que revestia nossos lábios, nossos beijos... algo imune à dor, à crueldade, um sentimento que representava uma verdadeira fuga para um lugar bom e tranquilo... a grande e eterna busca humana pelo bom e tranquilo...
Porém, como num passe de mágica, percebi o vôo rasante de um gavião sorrateiro... via sua presa, ali, à sua mercê... à sua inteira disposição... e tomou-lhe posse... agarrou a canarinha pelo bico, de maneira forte, dura, vil, encerrando aquele breve momento de felicidade do pobre casal de canarinhos, enquanto caía a noite impiedosa...qual seu objetivo, não sei. Para onde voou, com a canarinha presa ao bico encurvado, não vi.
O canarinho, num instinto de sua natureza, como que dotado de razão, percebendo que estava sendo ceifada sua felicidade, voou desesperado atrás do malfeitor gavião... batia as pequenas asinhas buscando se aproximar do mesmo... porém, o animal negro, com suas grandes e fortes asas, voava cada cez mais rápido e mais alto, evadindo-se da vista do pobre canarinho, e da minha também... era o final forçado daquele momento áureo...
Olhava, e chamou-me a atenção que o canarinho, coitado, voltou ao mesmo galho onde estava com a canarinha, antes daquilo que ocorreu... voando cansado, vagarosamente, triste, como que dotado de razão para saber que seu amor não mais volta... em toda a sua pequenez, regozijou-se, parado no galho, como que lamentando o que aconteceu...
Talvez pelo efeito da brisa... creio que notei molhados os cantinhos dos pequenos olhos do canarinho solitário... naquele momento, imaginei que ele sabia realmente que seu amor não mais volta, que veio a fatalidade e retirou-lhe aquela felicidade tão grande, aquela paz tão simples que viveu...
Nessa hora, apertou-me o coração e comecei a chorar sozinho, sem perceber, no jardim de minha pequena chácara. Chorei, pois, por piedade do pobre canarinho, que ficou sem o seu bem maior, perdendo assim sua própria razão de existir... nem os canarinhos são capazes de viver sozinhos... chorei pois tive saudade, daquela felicidade que o destino me roubou... tal como o gavião roubou a felicidade do canarinho... desde que se foi o meu primeiro e único amor, meu viver nesta pequena casinha também é solitário... hoje eu sou igual a esse canário... e espero a hora de reencontrar-me com o meu amor, junto de Deus.
(meus agradecimentos a Ariowaldo Pires e Laureano, compositores da belíssima canção "Destinos iguais", que serviu de base para a produção desta pequena crônica)